Complexidade
tributária, guerra fiscal e despesas governamentais foram os principais temas
abordados durante a conferência “O modelo fiscal brasileiro”, promovido pelo
grupo Ejesa, por meio do BRASIL ECONÔMICO, e patrocinado pela KPMG. Algumas
soluções foram encontradas, mas o sentimento de insegurança jurídica dominou os
debates.
No evento, que
reuniu nomes como o do ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel,
representantes de empresários criticaram a falta de clareza da legislação
nacional. Em uma oportuna intervenção, Paulo Rabello de Castro, presidente do
conselho de Economia da Federação do Comércio (Fecomercio), disse que
não há um mínimo de segurança jurídica para o empreendedorismo no país. A
guerra fiscal também foi amplamente discutida e quase alcançou um consenso
entre os palestrantes: ela teria sido possibilitada pela autonomia exacerbada
de governadores. A crise deflagrada pelas diferentes alíquotas de ICMS (Imposto
sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) esquentou as argumentações. “O ICMS
hoje possui mais de 70 obrigações acessórias. O empresário tem que fazer o que
sabe”, alarmou Roberto Mateus Ordine, vice-presidente da Associação Comercial
de São Paulo (ACSP).
Everardo Maciel,
durante a discussão sobre a Guerra Fiscal, trouxe dados estarrecedores sobre a
situação da principal fonte de arrecadação dos estados. “Ao somarmos as
diferentes alíquotas cobradas por todos os estados e suas diferentes bases de cálculo,
teremos 57 impostos diferentes”, afirmou. Marienne Coutinho, sócia da área de
Tax da KPMG, disse se preocupar com empresas que estão entrando agora no
mercado brasileiro. Segundo ela, não é possivel traçar um plano seguro para as
companhias. “Os novos entrantes devem ou não requerer algum beneficio
tributário? Com uma decisão desfavorável do Supremo Tribunal Federal (STF) elas
podem perder da noite para o dia sua competitividade além de ter que pagar os
débitos criados. A situação é de extremo risco", avalia.
Julio Maria de
Oliveira, reiterou a tese de inconstitucionalidade dos benefícios fiscais
concedidos por meio de créditos de ICMS. “Todos os estados descumprem a
legislação diariamente" , afirmou.
Por fim, os
debatedores criticaram a alta Carga Tributária brasileira.
Atualmente, a arrecadação nacional alcança o patamar de 34% do Produto Interno
Bruto. Porém, foi de claro entendimento que o problema principal não está do
lado da receita da União e dos Estados, mas sim na outra ponta, a dos gastos.
Para o tributarista Pedro Guilherme Lunardelli, a distribuição da renda deveria
estar no centro de qualquer discussão sobre reforma tributaria. “As
contribuições sociais, como PIS e Cofins, precisam ter uma destinação
especifica. Mas funcionam como qualquer outro imposto", assinalou. “Já
tivemos uma pequena reforma tributária chamada controle da arrecadação. Agora
precisamos de um controle da destinação dos recursos", complementou
Lunardelli.
Roberto Mateus Ordine
lembrou que as contribuições sociais, criadas a partir da década de 1960,
ganharam participação ano a ano na arrecadação nacional. “Elas sairam de 0,5%,
quando a primeira foi criada em 1965, para 23 ”/.. do total da receita em
2011", reclamou o vice-presidente da ACSP. A Cofins também foi
um debate à parte. Foi unânime as reclamações em torno da contribuição. A
critica é que ninguém entende as regras do imposto. “A Cofins de 2012
é completamente diferente da de 2002. São dois mundos distintos. Uma complexidade
desnecessária. Agora acontece um uso muito forte do tributo como política
econômica", afirma Maciel.
No entanto, sua
critica ao período em que o país foi governador por Luiz Inácio Lula da Silva e
Dilma Rousseff não ficou sem resposta dos outros palestrantes. “Que me desculpe
a pessoa ilibada que é o doutor Maciel, mas o sistema tributário nacional é
caótico e não e de hoje. Foram puxadinhos feitos ao longo de anos que
transformaram nosso modelo fiscal em uma desconfortável favela", afirmou
Paulo Rabello de Castro. “Para solucionar, vejo o ICMS nacional compartilhado
surgindo. Um imposto único sobre produção, movimentação e consumo",
profetizou.
ENTREVISTA PAULO
RABELLO DE CASTRO
Presidente do
conselho de Economia da Fecomercio
“Este manicômio
tributário está nos custando R$ 50 bi por ano”
Para o economista,
a complexidade fiscal impede Investimentos privados no país
Existe insegurança
jurídica no sistema tributário?
Não acho que
exista insegurança, tenho a certeza de que vivemos no caos tributário. Não é
apenas no campo da arrecadação. No campo das despesas públicas, afora as
cachoeiras, temos um problema de câncer na medula, que é a extinção do conceito
de orçamento. E isso quem falou foi o ex-secretário da Receita Federal Everardo
Maciel, que, sem meias palavras, afirmou que oOrçamento público é uma
ficção. Resgatar portanto o conceito de um Orçamento eficaz e de uma
tributação eficiente é um desafio para a cidadania brasileira. É um momento
revolucionário. Pois quem deveria ser o guardião da lei, não a defende e também
não a pratica.
O que espera do
projeto da comissão montada pelo Senado para resolver a guerra fiscal?
É um passo
importante, mas por não ser cirúrgico, e que provavelmente ficará pedindo
desculpas a esta velha e arcaica estrutura que formou a comissão, é algo que já
vem com um vício original. Trata-se de uma comissão que se organiza por dentro
da cidadela do arcaísmo e do retrocesso.
A comissão é
viciada?
Não é que ela vá
reproduzir algum vício, mas esta é uma comissão que provavelmente não vá ferir
a discussão em seu âmago. O que é que o cidadão quer? Quer um sistema simples,
cômodo e fácil de entender. É preciso uma simplificação cirúrgica. Não adianta
a comissão me trazer cinquenta novos procedimentos. Precisamos de 3 ou 4
viradas cirúrgicas. Precisamos de um único imposto sobre a produção, circulação
e consumo das mercadorias. Um único. Paulo Rabello: “Quem deveria ser o
guardião da lei não a defende e também não a pratica”
E renda,
importação?
A renda, outro
único imposto, seja de pessoa física ou jurídica. E um único imposto sobre o
comércio exterior. Importação sem a aplicação de IPI, ICMS etc.? Você já está
citando diversos tributos que não condizem com o pensamento simplificado. O
país quer a redução imediata dessa complexidade. Desta verdadeira barafunda
tributária. Um movimento em nome de um crescimento que não está mais acontecendo.
Este manicômio está nos custando R$ 50 bilhões por ano, segundo cálculos do
Movimento Brasil Eficiente.
De onde vem essa
cifra? De onde se tirou esse número? É o quanto foi gasto com
tributaristas?
Isso é dinheiro
perdido. Isso é o que se perde com Investimentos que não se realizam
em milhões de empresas brasileiras. Uma parte considerável da renda que seria
retida na mão do empresário para reinvestimento, deixa de acontecer. Esse é o
grande prejuízo. É o que você deixou de produzir como empresário. É também o
que você deixou de guardar como família, pois já foi tungado ao financiar um Orçamento absolutamente
descontrolado.
Empresários com
medo de “canetada” do STF
Forçar o fim da
guerra fiscal pode causar mais prejuízos do que benefícios, diz palestrante
“O setor têxtil
não existiria no nordeste sem incentivos fiscais”. Com a frase acima, o
tributarista Pedro Guilherme Lunardelli inaugurou o debate sobre a guerra
fiscal no seminário promovido pelo BRASIL ECONÔMICO .
Segundo ele, o fim
dos benefícios tributários concedidos pelos estados impactaria diretamente o
plano econômico de grande parte do empresariado nacional. “Podem haver cinco
mil artigos na legislação do ICMS, mas que sejam os mesmos cinco mil artigos
para os 27 estados. Mas isso não pode acontecer por meio de uma determinação do
STF (Supremo Tribunal Federal”, disse ao lembrar da proposta de súmula
vinculante nº 69, redigida pelo ministro Gilmar Mendes e que pode colocar um
fim aos incentivos estaduais. Para o ex-secretário da Receita Federal Everardo
Maciel, a guerra fiscal é apenas parte de um problema federativo maior. “Nunca
vi uma crise como a que estou vendo. Este é um enfrentamento que o Congresso
terá de discutir dissociado de todo o resto”, disse Maciel. O tributarista
aproveitou para elencar uma série de embates que devem surgir na Câmara dos
Deputados e no Senado até o final do ano. “Fundo de Participação dos Estados
(FPE), que precisa ser revisto até 31 de dezembro, roylaties, dívidas dos
estados e guerra fiscal. Tudo relacionado ao primeiro ponto, o FPE”, alertou
Maciel. Ele lembrou que, como relator da comissão especial constituida pelo
Senado, um anteprojeto para resolver as discussões em torno destes temas deve
ser concluído até o final de agosto.
Enquanto uma
solução politica não é encontrada, Marienne Coutinho, sócia da área de Tax da
KPMG, teme pela segurança juridica de um sistema no qual estão inseridos todos
os seus clientes. “Vibramos quando um cliente vem para o Brasil, mas temos que
falar a verdade para eles. E a verdade é que a grande maioria possui beneficios
fiscais e esta em risco", afirma Marienne. Uma das soluções criadas por
Paulo Rabello de Castro, presidente do conselho deEconomia da Fecomercio,
e coordenador do Movimento Brasil Eficiente, é a nacionalização do ICMS.
Com a proposta, se
tiraria a autonomia dos estados, concedendo ao governo federal a obrigação da
arrecadação e distribuição do montante. “Temos já a adesão do governador
Geraldo Alckmin (PSDB/ SP) e Eduardo Campos (PSB/PB). Além disso, Santa
Catarina se mostrou favorável à proposta", comenta Castro. O projeto de
Castro foi bem aceito pelos debatedores, que estavam convencidos que o excesso
de autonomia dos estados promoveu a guerra fiscal. Tanto o tributarista Lunardelli,
quanto seu colega Júlio Maria de Oliveira, entendem como inconstitucional e uma
transgressão às leis federais os incentivos fiscais. “A unificação é uma perda
imediata de poder dos governadores, que descumprem a legislação todos os
dias", criticou Oliveira. I G.M.
Alta carga de
impostos e estrutura complexa dificultam investimentos
Marienne Coutinho,
da KPMG, avalia que o sistema atual dificulta a vinda de investidores
estrangeiros para o país, embora eles estejam interessados na Economia brasileira
e em busca de alternativas de negócio fora da Europa e dos Estados Unidos
Uma reforma
tributária é necessária para atrair maior fluxo de Investimentos para
o país, o que pode auxiliar no financiamento de obras de infraestrutura
necessárias para o crescimento daEconomia nacional. Marienne Coutinho,
sócia da área de tax da KPMG, diz que a alta Carga Tributária e a
complexidade do sistema dificultam a vinda de investidores estrangeiros para o
país, atraídos por uma Economia fortalecida e em busca de alternativas
de negócio fora da Europa e dos Estados Unidos. Ela aponta que o número de
consultas de investidores estrangeiros com interesse em adquirir ou iniciar
negócios no país aumentou dez vezes nos últimos anos na consultoria.
“São empresas e
negócios que complementam nossas demandas locais e são promissores. Mas o
sistema tributário é um obstáculo para estes investimentos”. Isso porque, caso
os empreendedores optem por adquirir uma empresa, é necessário avaliar seu Risco fiscal.
“As normas são rígidas na Europa. Quando vêm para o país, encontram muita
sonegação, o que é um obstáculo para a aquisição. É importante que o governo
aumente a fiscalização, tanto de empresas como agentes da Receita, que podem
receber propinas”, diz Marienne. No caso daOpção por começar um Investimento do
zero,além da alta quantidade de impostos, os investidores se deparam com leis
pouco claras, bem como autuações cujos processos se arrastam por anos.
“A alíquota do Imposto
de renda não é exorbitante, mas, quando o investidor pede para somarmos
todos os impostos, a conta fica cara”, conta Marienne. “Mas a alta Carga
Tributária não é o principal problema. Para atender as demandas do sistema
tributário nacional, os empresários precisam de equipes maiores e mais recursos
tecnológicos devido a normas complexas, o que também acaba se refletindo em
custos”.
Para o advogado
tributarista Pedro Lunardelli, é possível comparar a Carga Tributária do
Brasil, que atingiu 33,56% do PIB em 2010, com outros países de capacidade
similar. “O grande problema é o controle do sistema”. O Economista Paulo
Rabello de Castro, autor do livro “A reforma da reforma: a estrutura
tributária” e articulista do BRASIL ECONÔMICO, também acredita que a alta Carga
Tributária dificulta o fluxo de Capital no país. “O sistema tem
um poder destrutivo sobre os investimentos. A Economia se
estabilizou, e o mesmo deveria acontecer com a tributação”. Julio Maria de
Oliveira, advogado tributarista do escritório Machado Associados, concorda que
todos deveriam pagar a conta quando a Economia vai mal, inclusive o
governo. “O sistema tributário se desvinculou da economia, o que é resultado da
artificialização de impostos”.
Brasil Eficiente
Em busca de
soluções, o Movimento Brasil Eficiente ganhou, na semana passada, adesão do
governo de São Paulo. Ao lado de Santa Catarina e Pernambuco, são três estados
que apóiam o movimento. O objetivo é propor medidas de racionalização,
simplificação e redução de impostos, bem como melhorar a gestão dos gastos
públicos. Entre as propostas está a redução gradual daCarga Tributária a
partir de 2014 em um ponto porcentual por ano para chegar, em 2020, ao nível de
30% do PIB. O movimento civil está aberto a adesões pelo site www.brasileficiente.org.br.
Fonte: Brasil Econômico
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